1. Sinais de relações pouco saudáveis
2. Impacto da violência doméstica
3. Excursus: Outsiders as witnesses of domestic violence
4. Indicadores de violência doméstica em adultos
Fontes
Introdução
Bem-vindo ao Módulo 2 sobre “Indicadores de violência doméstica”. Neste modulo, irá debruçar-se sobre a míriade de consequências da violência doméstica para a saúde, aprender sobre a sua identificação, adquirindo conhecimentos sobre indicadores que englobam aspectos comportamentais, físicos e emocionais. Além disso, o papel e o impacto das pessoas que testemunham a violência doméstica também serão apresentados nesta jornada.
Objectivos de aprendizagem
+ Compreender as consequências multifacetadas da violência doméstica para as vítimas, as famílias e as comunidades, incluindo os impactos físicos, psicológicos e sociais.
+ Adquirir as competências necessárias para identificar potenciais indicadores e “sinais de alerta” – utilizando pistas comportamentais, físicas e emocionais.
+ Reconhecer os efeitos emocionais e psicológicos de ser testemunha da violência doméstica, particularmente nas crianças, e compreender a importância de criar ambientes seguros para todos os membros da família.
1. Sinais de relações pouco saudáveis
Algumas relações, em vez de melhorar o nosso bem-estar, podem ter um impacto negativo no mesmo. Algumas podem atingir o nível de toxicidade, pelo que é fundamental saber identificar os sinais de alerta.
Estes sinais de alerta, frequentemente designados por “red flags“, servem como indicadores de um comportamento pouco saudável ou manipulador. Nem sempre são reconhecíveis à primeira, o que os torna tão perigosos.
A toxicidade pode estar presente em todas as formas de relações íntimas, por exemplo, entre amigos, no trabalho com colegas, entre membros da família ou em parcerias românticas.
2. Impacto da violência doméstica
Cada vítima é diferente e o impacto individual e cumulativo de cada acto de violência depende de uma complexidade de factores. Embora cada indivíduo sinta e viva a violência doméstica de forma única, há muitas consequências transversais e comuns de viver num ambiente de violência e/ou de medo. Muitas vezes, os efeitos físicos, emocionais, psicológicos, financeiros e outros, a curto e a longo prazo, são bastante semelhantes.
É importante compreender os efeitos da violência doméstica nas vítimas, porque esses efeitos são responsáveis por muitos indicadores que elas nos apresentam.
Note-se que as listas representam apenas uma selecção, não sendo por isso exaustivas:
Impacto da violência doméstica numa criança (testemunho ou experiência)
“As pessoas que viveram experiências desafiantes ou traumáticas na infância têm maior probabilidade de apresentar deficiências físicas e cognitivas na velhice.”3 Na tabela seguinte, encontrará mais exemplos do impacto a curto e a longo prazo da violência doméstica numa criança que viveu ou testemunhou uma situação de violência doméstica:
- As crianças que sofreram violência e têm problemas de saúde mental (por exemplo, sintomas psicossomáticos, depressão ou tendências suicidas) têm maior propensão para abuso de substâncias, gravidez juvenil e comportamento criminoso.10
- As crianças podem aprender que é aceitável exercer controlo ou aliviar o stress recorrendo à violência, ou que a violência parece estar ligada a expressões de intimidade e afecto. Este facto pode ter um forte impacto negativo sobre as crianças em situações sociais e nas relações ao longo da infância e mais tarde na vida.
- As crianças podem também ter de lidar com o facto de ficarem temporariamente sem abrigo, de mudarem de local e de escola, de perderem amigos, animais de estimação e bens pessoais, de serem continuamente assediadas pelo agressor e de sofrerem o stress de estabelecer novas relações.
3. Excurso: Pessoas como testemunhas de violência doméstica
Dado o impacto negativo, a curto e longo prazo, nas pessoas que vivem num ambiente com violência doméstica e dado que a maioria se remete ao silêncio, é fundamental que os prestadores de cuidados e os membros da família, bem como os vizinhos ou colegas de trabalho, que são potenciais testemunhas de violência doméstica, não desviem o olhar.
Tarefa para reflexão
(1) Quais são os “sinais de alerta” (“red flags”) apresentados neste vídeo que indicam que se trata de uma relação tóxica em que a violência doméstica está presente e que alguém precisa de ajuda?
(2) O que é que faria?
A cooperação e o consentimento da vítima são os pré-requisitos mais importantes para intervir como testemunha. A intervenção de uma testemunha pode incluir falar com a vítima, ajudar a aceder a serviços de ajuda ou, por exemplo, apoiar a denúncia da violência doméstica à polícia.
Factores que podem inibir ou encorajar a intervenção das testemunhas.
Para mais informações sobre os factores decisivos para a intervenção de testemunhas de casos de violência doméstica podem ser consultadas aqui:11 www.eige.europa.eu/gender-based-violence/eiges-work-gender-based-violence/intimate-partner-violence-and-witness-intervention?lang=sl
4. Indicadores gerais de violência doméstica em adultos
Existe uma panóplia de indicadores que servem de “sinais de alerta” de que uma pessoa pode estar a sofrer violência doméstica. Alguns deles são bastante subtis. Deste modo, é importante que os profissionais estejam atentos aos potenciais sinais e respondam de forma adequada. Note-se que nenhum ou todos estes sinais podem estar presentes e ser indicadores de outros problemas. A forma de interacção e o comportamento da vítima podem deixar pistas e ser reveladoras de violência doméstica. Para informações mais pormenorizadas sobre comunicação, consulte o Módulo 3.
As vítimas confiam nos profissionais para ouvir, persistir e inquirir os sobre sinais e pistas. Elas precisam que os profissionais dêem seguimento às conversas em privado, registem os pormenores dos comportamentos, sentimentos e lesões observados e comunicados e os apoiem de acordo com os sistemas da sua organização e as vias locais.
A manifestação dos sintomas de violência doméstica difere de acordo com as diferentes origens culturais das pessoas. É preciso ter consciência da sua própria perspectiva, preconceitos e estereótipos quando ou ao comunicar com uma potencial vítima, uma vez que estes factores podem ter impacto na forma como avalia os seus sintomas. Para mais informações, consulte o Módulo 8.
É necessário ter em atenção que nenhum ou todos estes indicadores podem estar presentes e ser indicadores de outros problemas, mas podem servir como sinais de alerta e motivo de atenção acrescida podendo apontar para uma história de violência doméstica.
Aqui, encontrará uma série de potenciais indicadores de saúde, indicadores psicológicos para adultos e indicadores específicos relativos a grupos vulneráveis. Nos capítulos seguintes, encontrará também indicadores específicos adaptados à ginecologia/obstetrícia, à cirurgia, à pediatria e à medicina dentária.
Para maior clareza, os indicadores estão classificados por cores: Amarelo: Indicadores gerais; Verde: Indicadores comportamentais; Azul: Indicadores psicológicos.
Potenciais indicadores de saúde
- Doenças crónicas, incluindo dores de cabeça, dores musculares, articulares e nas costas12
- Dificuldade em comer/dormir
- Sintomas do foro cardiológico sem evidência de doença cardíaca (palpitações cardíacas, hipertensão arterial, enfarte do miocárdio sem doença obstrutiva)
Potenciais indicadores psicológicos
- Sofrimento emocional, por exemplo, ansiedade, indecisão, confusão e hostilidade13
- Auto-agressão ou tentativas de suicídio14
- Queixas psicossomáticas
- Perturbações do sono e da alimentação (por exemplo, anorexia, bulimia, compulsão alimentar)15
- Depressão/depressão pré-natal16
- Isolamento social/ não ter acesso a transportes ou dinheiro17
- Comportamento submisso/baixa autoestima18
- Medo de contacto físico19
- Abuso de álcool ou drogas20, 21
Potenciais indicadores comportamentais
- Recurso frequente a tratamentos médicos em várias instalações
- Mudança constante de médicos22
- Intervalo de tempo desproporcionadamente longo entre a ocorrência da lesão e o tratamento
- Resposta hesitante quando lhe é perguntado o historial médico
- Negação, explicações contraditórias sobre a causa da lesão
- Comportamento super protector do acompanhante, comportamento controlador
- Ausência frequente do trabalho ou dos estudos
- Evasão ou vergonha em relação às lesões
- Ansiedade na presença do parceiro ou de familiares
- Reacções nervosas ao contacto físico/movimentos rápidos e inesperados
- Comportamento facilmente assustadiço
- Chora facilmente quando lhe fazem perguntas
- Reacções extremamente defensivas no momento em que lhe são feitas perguntas específicas
Possíveis indicadores que se aplicam especificamente ao grupo vulnerável dos idosos:
Potenciais indicadores de violência doméstica contra os idosos
- Falta de higiene básica
- Fraldas molhadas
- Falta de ajudas médicas como andarilhos, dentaduras
- Escaras, úlceras de pressão
- O prestador de cuidados fala do idoso como se ele fosse um fardo
Alguns profissionais receiam que a discussão sobre o suicídio possa despoletar na pessoa em risco, mas, na realidade, falar sobre o suicídio pode reduzir a sua ansiedade e promover a compreensão. Se alguém estiver a pensar ou a planear suicidar-se, ou se tiver um historial recente de auto-mutilação e estiver em extrema angústia ou agitação, não o deixe sozinho. Encaminhe-a imediatamente para um especialista ou para um centro de saúde de emergência.
Fontes
- Mellar, B. M., Hashemi, L., Selak, V., Gulliver, P. J., McIntosh, T. K. D., & Fanslow, J. L. (2023). Association Between Women’s Exposure to Intimate Partner Violence and Self-reported Health Outcomes in New Zealand. JAMA network open, 6(3). doi.org/10.1001/jamanetworkopen.2023.1311 ↩︎
- Danese, A., Widom, C. S. (2023). Associations between Objective and Subjective Experiences of Childhood Maltreatment and the Course of Emotional Disorders in Adulthood. JAMA Psychiatry, 80, 1009-1016. doi: 10.1001/jamapsychiatry.2023.2140 ↩︎
- Stiles, M. (2003). Witnessing domestic violence: The effect on children. American family physician, 66, 2052, 2055-2056, 2058 passim ↩︎
- Lee, V. M., Hargrave, A. S., Lisha, N.E., & Huang, A. J. (2023). Adverse Childhood Experiences and Aging-Associated Functional Impairment in a National Sample of Older Community-Dwelling Adults. Journal of General Internal Medicine, 38, 3362-3371. doi.org/10.1007/s11606-023-08252-x ↩︎
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- Moylan, C. A., Herrenkohl, T. I., Sousa, C., Tajima, E. A., Herrenkohl, R. C., & Russo, M. J. (2010). The Effects of Child Abuse and Exposure to Domestic Violence on Adolescent Internalizing and Externalizing Behavior Problems. Journal of Family Violence, 25(1), 53-63. doi:10.1007/s10896-009-9269-9 ↩︎
- Monnat, S. M., Chandler, R. F. (2015). Long Term Physical Health Consequences of Adverse Childhood Experiences. Sociological Quarterly, 56(4), 723-752. doi:10.1111/tsq.12107 ↩︎
- Vargas, L., Cataldo, J., & Dickson, S. (2005). Domestic Violence and Children. In G.R. Walz & R.K. Yep (Eds.): VISTAS: Compelling Perspectives on Counseling. Alexandria, VA. American Counseling Association, 67-69 ↩︎
- Felitti, V. J., Anda, R. F., Nordenberg, D., Williamson, D. F., Spitz, A. M., Edwards, V., Koss, M. P., & Marks, J. S. (1998). Relationship of Childhood Abuse and Household Dysfunction to many of the Leading Causes of Deaths in Adults. The Adverse Childhood Experiences (ACE) Study. Adult Health Status to Childhood Abuse and Household Dysfunction. American Journal of Preventive Medicine, 14, 245-258. ↩︎
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- Western Australian Family and Domestic Violence Common Risk Assessment and Risk Management Framework (2023). Indicators of family and domestic violence. Factsheet. www.wa.gov.au/system/files/2021-10/CRARMF-Fact-Sheet-2-Indicators-of-FDV.pdf ↩︎
- Royal Australian College of General Practitioners (2024). Abuse and Violence: Working with our patients in general practice. www.racgp.org.au/clinical-resources/clinical-guidelines/key-racgp-guidelines/view-all-racgp-guidelines/white-book ↩︎
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- Hegarty, K., & O’Doherty, L. (2011): Intimate partner violence – Identification and response in general practice. Australian Family Physician, 40(11):852-6. www.racgp.org.au/getattachment/5c90283f-fa0d-44dc-a9b5-edd7ed7776c6/Intimate-partner-violence.aspx ↩︎