5. Vítimas de violência doméstica

Vítimas na dinâmica da violência doméstica nas relações
Tarefas para reflexão
Visuzaliza o vídeo e responde às perguntas das imagens seguintes. As respostas encontram-se no diapositivo seguinte à pergunta.
Mais informações sobre a culpabilização da vítima no Módulo 8
Espectro de grupos de vítimas
Crianças e adolescentes

“A nível global, estima-se que até 1 bilhão de crianças com idades entre 2 e 17 anos tenham vivenciado violência física, sexual, emocional ou negligência no último ano.”
Global prevalence of past-year violence against children: a systematic review and minimum estimates. Hillis S, Mercy J, Amobi A, Kress H. Pediatrics 2016; 137(3): e20154079.
A violência contra crianças tem impactos duradouros na saúde e bem-estar das crianças. Crianças em relações de violência doméstica sofrem traumas significativos, mesmo que estejam a testemunhar a violência dentro da família:
- Pode resultar em comportamentos negativos e de risco à saúde (uso indevido de álcool e drogas, elevados níveis de ansiedade, depressão, outros problemas de saúde mental e suicídio)
- Pode prejudicar o desenvolvimento do cérebro e do sistema nervoso (afectando negativamente o desenvolvimento cognitivo e reduzindo as conquistas educacionais)
- Pode aumentar o risco da criança se tornar uma vítima e/ou agressor no futuro
Fonte: WHO Violence against children
O seguinte estudo de caso ilustra isso:
Estudo de Caso: Violência doméstica tem um impacto negativo nas crianças
Gabby casou-se com Nick, seu marido, após uma longa relação e pouco tempo depois mudou-se para a quinta da família do marido. O casal era feliz na quinta e tiveram a sua primeira filha. Durante a gravidez, o comportamento de Nick começou a mudar e, quando a filha nasceu, o relacionamento tornou-se diferente. Nick parecia retraído e passava longos períodos sozinho. Com este comportamento Gabby começou a lembrar-se do pai de Nick, que sempre fora uma presença austera na sua vida.
O comportamento de Nick tornou-se ameaçador e controlador, especialmente em relação ao dinheiro e ao contacto social. Ele tornou-se cada vez mais agressivo em discussões e frequentemente gritava e lançava objectos. Gabby pensava que, como ele não a magoava fisicamente, o seu comportamento não se qualificava como abuso. Nick não mostrava muito interesse pela filha deles, Jane, excpeto quando estava em público, onde parecia ser um pai amoroso e atencioso.
Jane era geralmente uma criança bem-comportada, no entanto, Gabby descobriu que não conseguia deixá-la com mais ninguém. Jane chorava e ficava visivelmente angustiada quando Gabby a entregava aos cuidados de outra pessoa. Isso era stressante para Gabby o que também condicionava as suas actividades sociais, tornando-as assim ainda mais limitadas.
Jane demorou algum tempo para gatinhar, andar e começar a falar. Os seus padrões de sono eram interrompidos, e Gabby muitas vezes não dormia a noite toda, mesmo quando Jane tinha mais de 12 meses de idade. Quando Jane começou a falar, ela desenvolveu um gaguez, o que dificultou ainda mais o desenvolvimento da sua fala. Gabby preocupava-se muito com a sua filha, Jane. O médico da família disse-lhe que isso era normal para algumas crianças e que, se os problemas de fala persistissem, ela sempre poderia encaminhar a Jane para um especialista mais tarde.
Passados alguns anos, o comportamento de Nick tornou-se inaceitável para Gabby. Durante as discussões, ele empenhava a sua espingarda, que ele tinha para fins agrícolas, e Gabby considerou isso muito ameaçador. Em várias ocasiões, Nick atirava objectos que atingiam Gabby e a sua preocupação e medo pela filha aumentava. Gabby decidiu sair e consultou o serviço local de apoio a mulheres vítimas de violência, que a ajudou a obter uma ordem de restrição contra Nick.
Após o afastamento da Jane, a sua filha, do Nick, o comportamento dela mudou. O desenvolvimento de Jane parecia acelerar e Gabby não conseguia compreendia o motivo. Como parte do aconselhamento e intervenção, ela discutiu esse problema, e a sua conselheira reconheceu o atraso no desenvolvimento, a gaguez, a irritação e a ansiedade da separação como efeitos da situação abusiva anterior de Jane.
Isto pode ser considerado como uma oportunidade perdida para identificar a violência familiar. Se o médico da família tivesse perguntado à Gabby ou ao Nick (que apresentou dor crónica nas costas) sobre a relação, sobre o que estava a acontecer com a família e especificamente com Jane, a situação poderia ter sido identificada com maior antecipação.
Tarefas para reflexão
(1) O que poderia ter sido feito melhor pelos intervenientes?
(2) Reserve um momento para considerar quais as agências e profissionais que deveriam ter-se envolvido para apoiar e/ou fornecer serviços à Gabby desde o início.
Adaptado de RACGP (2014): Abuse and Violence: Working with our patients in general practice
Idosos
“1 Em cada 6 pessoas com mais de 60 anos,
WHO, 2022
Foram vítimas de algum tipo de abuso na comunidade
no passado ano”
Os perpetradores podem ser:
- Filhos, outros membros da família e cônjuges, bem como
- Funcionários, por exemplo, em lares de idosos ou residências assistidas
Desafios da deúncia:
- Medo de enfrentar mais abuso
- Crescente dependência dos cuidadores
- Com o avanço da idade, a vontade e a capacidade de escapar de relações abusivas diminuem.
Lembre-se: Idosos vítimas de violência doméstica podem ser relutantes para denunciar o abuso. Podem sentir-se envergonhados ou constrangidos ou querer ajudar e proteger seu filho abusivo. Relatar violência doméstica à polícia pode fazê-los perder o relacionamento mais significativo de suas vidas.
Estudo de caso: Abuso de idosos
Winnie, de 69 anos, mora sozinha numa pequena cidade do interior. Ela é sua paciente há vários anos. Ela tem artrite severa e precisa de cada vez mais ajuda com as suas actividades diárias. Mesmo com visitas regulares de serviços sociais, ela considera difícil de lidar, mas está determinada a não ir para o hospital.
Eventualmente, ela muda-se para a casa da filha e do marido e dos seus jovens filhos. Os vizinhos começam a reclamar do barulho. Desde que Winnie se mudou, não há muito espaço na casa e as crianças brigam cada vez mais, gritando e brincando do lado de fora com mais frequência. A filha de Winnie não recebe ajuda das suas irmãs e esperam que ela cuide da lavagem, cozinha e demais tarefas aumentadas sem reclamar.
No decurso das suas visitas domiciliares à Winnie, nota que ela apresenta marcas e hematomas nos braços e no torso superior. A filha explica, dizendo que ela está a ficar mais desajeitada pelo que bate nas coisas e nos móveis, para além de que Winnie está a tomar medicação anticoagulante. Winnie reage balançando a cabeça sem comentar nada, quando lhe pergunta se tudo está bem em casa, ou mesmo quando fala com ela em particular. Está preocupado em pressionar o assunto, pois não quer incomodar ninguém levantando um falso testemunho.
Adaptado de RACGP (2014): Abuse and Violence: Working with our patients in general practice
Tarefas para reflexão
Discuta o estudo de caso.
(1) O que faria sendo médico da Winnie nesta situação?
(2) Quais são os principais factores de risco para Winnie sofrer de violência doméstica?
Gestantes
“na Europa 1 em cada 4 mulheres sofre
de violência física e/ou sexual durante a gravidez”
A gravidez pode actuar como um catalisador para a violência doméstica e a violência contínua pode intensificar-se durante a gravidez ou no período pós-parto. Sofrer violência doméstica durante a gravidez representa sérios riscos tanto para a mãe como para o bebé não nascido. A probabilidade de aborto espontâneo, infecções, parto prematuro e dano ou até mesmo morte do bebé são aumentam nestes casos.
Para além disso, a violência doméstica durante a gravidez pode ter consequências significativas para a saúde emocional e mental. O stress e a ansiedade causados pela presença de violência doméstica podem impactar adversamente no desenvolvimento do bebé, bem como no bem-estar da mãe.
6. Perpetradores de violência doméstica
“A campanha para acabar com a violência doméstica precisa das vozes de homens e mulheres, desafiando o contexto cultural, económico e político em que todos nós vivenciamos o mundo”
HRH, the Duchess of Cornwall at the Women of the World Festival (March 2020), National Centre for Domestic Violence, UK
Definição
Um perpetrador é uma pessoa que comete, ou permite conscientemente, actos de abuso, negligência ou de exploração ocorrerem. Um acto também pode ser desencadeado por terceiros.
Fontes
Materiais de formação para serem usados em cursos ou para estudo pessoal podem ser consultados aqui.
Gerais
- Hester, M. (2013) Who does what to whom? Gender and domestic violence perpetrators in English police records. European Journal of Criminology, 10(5), pp. 623-637
- Myhill, A. (2017) ‘Measuring domestic violence: Context is everything’, Journal of Gender-Based Violence, Vol. 1, No. 1, pp. 33–44
- Walby, S. and Towers, J. (2017) Measuring violence to end violence: mainstreaming gender. Journal of Gender-Based Violence, 1(1), pp. 11-31
Excursus – Género
- EWL European Coalition Factsheet Istanbul Convention
- EWL Factsheet Violence against Women and Girls in Europe
- Violence against women prevalence estimates, 2018. Global, regional and national prevalence estimates for intimate partner violence against women and global and regional prevalence estimates for non-partner sexual violence against women. Geneva: World Health Organization, on behalf of the United Nations Inter-Agency Working Group on Violence Against Women Estimation and Data (UNICEF, UNFPA, UNODC, UNSD, UNWomen); 2021.
- Pioneers in skirts: https://www.pioneersinskirts.com/ is a multi-award-winning social impact film about the issues that affect a woman’s pioneering ambition. Real-life stories and frank commentary leave viewers seeing their role in the solution, feeling hopeful, and motivated to act.
- RESPECT Women: Preventing violence against women – Implementation package
- Vienna Declaration on Femicide
- UNODC
- https://ec.europa.eu/info/policies/justice-and-fundamental-rights/gender-equality/gender-based-violence/what-gender-based-violence_en
- Galdas, P. M., Cheater, F., & Marshall, P. (2005). Men and health helpseeking behaviour: literature review. Journal of Adomestic violenceanced Nursing, 49(6), 616-622
Formas de violência mais comum no contexto de violência doméstica
Tipos especiais de violência doméstica no contexto da violência doméstica
- http://www.haut-conseil-egalite.gouv.fr/IMG/pdf/violences-couple.pdf (Language: French)
- https://www.vie-publique.fr/sites/default/files/rapport/pdf/014000292.pdf (Language: French)
Mutilação genital feminina (FGM)
- https://www.unhcr.org/media/too-much-pain-female-genital-mutilation-and-asylum-european-union-statistical-overview
- https://eige.europa.eu/gender-based-violence/female-genital-mutilation?language_content_entity=en
- Intensifying global efforts for the elimination of female genital mutilation: Report of the Secretary-General (2022)
- FGM study: More girls at risk but community opposition growing (2021)
- FGM study: More girls at risk but community opposition growing (2021)
- Intensifying global efforts for the elimination of female genital mutilation: Report of the Secretary-General (2022)
Femicídio
- (1): UNODC, 2019 https://www.unodc.org/documents/data-and-analysis/gsh/Booklet_5.pdf
- (2): Dayan H. Female Honor Killing: The Role of Low Socio-Economic Status and Rapid Modernization. J Interpers Violence. 2021 Oct;36(19-20):NP10393-NP10410. doi: 10.1177/0886260519872984. Epub 2019 Sep 15. PMID: 31524058.
Violência e Abuso de Crianças e Adolescentes contra os Pais (CAPVA)
- (1) https://www.london.gov.uk/sites/default/files/comprehensive_needs_assessment_of_child-adolescent_to_parent_violence_and_abuse_in_london.pdf
- (2) Rutter, N., Hall, K., & Westmarland, N. Responding to child and adolescent-to-parent violence and abuse from a distance: Remote delivery of interventions during Covid-19. Children & Society. 2023;37:705–721. https://doi.org/10.1111/chso.12622
Coerção reprodutiva
- (1): Grace KT, Anderson JC (October 2018). “Reproductive Coercion: A Systematic Review”. Trauma, Violence & Abuse. 19 (4): 371–390. doi:10.1177/1524838016663935. PMC 5577387. PMID 27535921.
Espectro de grupos de vítimas
Pessoas com necessidades especiais (deficiência, incapacidade, doença mental)
- (1)https://safelives.org.uk/sites/default/files/resources/Disabled_Survivors_Too_Report.pdf
- Personal stories of autistic people as victims of violence
Idosos
- https://www.helpguide.org/articles/abuse/elder-abuse-and-neglect.htm
- http://criminal-justice.iresearchnet.com/crime/domestic-violence/elder-abuse-by-adult-children/
- https://www.nursinghomeabusecenter.com/elder-abuse/signs/
- https://www.abc.net.au/news/2015-07-16/royal-commission-abuse-of-elderly-is-under-reported-by-victims/6625230
- http://www.combatingelderabuse.eu/wp-content/uploads/2016/04/Booklet_stage.pdf
- Anetzberger, G.J., (2000) Caregiving: Primary Cause of Elder Abuse? Generations, 24 (2): 46–51
- Dong XQ and Simon MA (2014) Vulnerability Risk Index Profile for Elder Abuse in Community-Dwelling PopulationJ Am Geriatr Soc. 2014 Jan; 62(1): 10–15
- Laakso, S., (2015). Ikäihmisten kaltoinkohtelu Suvanto-linjan puheludokumenteissa. University of Helsinki, Faculty of Social Sciences. Dissertation.
- Uuttu-Riski, Ritva, (2004). Vanhusten kaltoinkohtelu – tiedotusvälineissä käyty keskustelu. Teoksessa Kankare, Harri & Lintula, Hanna (toim.) Vanhuksen äänen kuuleminen. Helsinki: Tammi.
Honour violência relacionada
Perpetradores de violência doméstica
Roda do poder e do controlo
(1) Wheel of Power and Control
Mulheres como perpetradoras
(1) Gerke J, Lipke K, Fegert JM, Rassenhofer M. Mothers as perpetrators and bystanders of child sexual abuse. Child Abuse Negl. 2021 Jul;117:105068. doi: 10.1016/j.chiabu.2021.105068. Epub 2021 Apr 17. PMID: 33878645.
Relação entre as crianças e o perpetrador e o seu impacto